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O que é “Capacidade de Trabalho”? – Parte 1

Por Marcus Lima em 10 de maio de 2015

Artigo interessante do Pavel Tsatsouline, o cara que é considerado o responsável por trazer o kettlebell de volta ao ocidente (Leia-se Estados Unidos), cabeça da empresa chamada StrongFirst. Traz uma discussão em cima das palavras “Capacidade de Trabalho” (ao que parece são muito usadas nos Estados Unidos, mas não muito por aqui) e várias considerações sobre os sistemas energéticos, motivo pelo qual resolvi fazer esta adaptação.

 

 

O que é “Capacidade de Trabalho”? – Parte 1

Pavel Tsatsouline

 

As palavras “capacidade de trabalho”, tem se juntado ao jargão da moda da indústria. Mas o que significam exatamente?

Algumas pessoas tem em mente um esforço suarento de vários minutos, que faz com que os músculos queimem e a frequência cardíaca vá nas alturas. Como um round de luta livre ou uma corrida de 800 metros rasos. Isto é glicólise anaeróbia.

Outros se inclinam a pensar em um trabalho manual, breves esforços intensos entremeados de atividades de baixa intensidade, levados a cabo durante horas. Em um jargão científico, isso pode ser chamado de “alta potência/tempo baixo” (N.T: A melhor tradução que consigo encontrara para a palavra “tempo” neste contexto, seria “cadência”, andamento ou até velocidade de execução. Caso algum leitor tenha uma definição mais apropriada, diga).
Isso seria atividade explosiva alática com recuperação aeróbia. “A+A” (N.T: Alático + Aeróbio), como nosso treinador da StrongFirst, Al Ciampa abreviou o termo.

Por alguma razão, poucas pessoas pensam em algum exercício predominantemente aeróbio quando se fala em capacidade de trabalho.

Este termo remonta à Suécia do pós guerra. Em 1947, o fisiologista clínico sueco T. Sjöstrand avaliou a “capacidade de trabalho físico” de trabalhadores de uma fundição de minério. Ele mediu a quantidade de trabalho físico que eles conseguiam fazer em uma bicicleta ergométrica a uma frequência cardíaca de 170 batimentos por minuto em um período de vários minutos.

Como todos os testes, este é tendencioso. Um ciclista deixaria o trabalhador comendo poeira. Então o trabalhador poderia convidar o ciclista para fazer um turno na fundição de minério….
Nós temos nosso próprio teste para ser um certificado em kettlebell da StrongFirst, o teste de 5 minutos fazendo arranco (N.T: Arranco é o termo em português para a palavra “snatch”, embora os praticantes de kettlebell usem geralmente a palavra em língua inglesa). Que pode ser criticado da mesma maneira.

Teste de 5 min. no arranco

O problema é que a “capacidade de trabalho físico”, não é somente dependente de habilidade, pedalar em uma bicicleta ou executar um exercício com kettlebell, mas depende também da especificidade do sistema energético.

Quando falamos a respeito de sistemas energéticos, “capacidade” tem um significado muito direto, o tamanho do tanque de combustível. E os tanques alático, glicolítico e aeróbio são enchidos e esvaziados de maneira diferente.

Não é possível de se testar todos de uma só vez. Para complicar um pouco mais as coisas, todos os 3 sistemas trabalham ao mesmo tempo, embora mudem a sua taxa de contribuição no total da necessidade energética (N.T: A taxa de contribuição é dependente do tipo, duração da atividade, capacidade individual do executante, etc.).

Então a “capacidade” testada pelo teste de 5 minutos de arranco não é a mesma testada pelo teste de 10 minutos.

O ciclista do exemplo acima, possui um enorme tanque de combustível aeróbio que o permite sustentar um esforço moderado por um longo período. O trabalhador da fundição por outro lado, tem uma alta capacidade alática – mais uma recuperação aeróbia eficiente. Em outras palavras, ele manuseia objetos pesados sem entrar em uma queima glicolítica (N.T: Uso do sistema da glicólise anaeróbia), então rapidamente se recupera. É a única maneira de fazer de forma eficiente o seu trabalho. Se o trabalhador permanecesse totalmente aeróbio, não teria a força necessária para carregar o metal pesado. Se ele entrasse em um “WOD” glicolítico, ele entraria em colapso, encharcado de suor em questão de apenas alguns minutos em seu turno de horas de trabalho.

(N.T: WOD: “Workout Of the Day”, termo usado pelos praticantes de Crossfit, significando “Sessão de Treinamento do Dia”. Atividades que geralmente recaem principalmente no metabolismo anaeróbio lático. Por isso o autor faz uma referência ao Crossfit quando fala do sistema anaeróbio lático).

Então, quando você larga as palavras “capacidade de trabalho”, esteja pronto para qualificar o sistema energético predominante: Alático, glicolítico ou aeróbio.

Ou especificar os parâmetros de carga física: Potência, tempo (N.T: De novo a palavra “tempo”, que pode significar cadência de execução, que me parece sr a melhor tradução no contexto) e duração. Se não fizer isso, estará apenas cuspindo um jargão sem sentido.

Existem protocolos comprovados de treinamento para os 3 sistemas energéticos. Para o sistema aeróbio, recomendo o livro: The Big Book of Endurance Training and Racing, escrito pelo Dr. Phil Maffetone.

Para o treinamento glicolítico, fiquem com as orientações descritas no artigo Long Rests publicado em nosso blog: 20-50 segundos de atividades explosivas com períodos longos de 1-5 minutos de esforços a 50%. Mais a respeito disso em um futuro próximo.

Um exemplo de um treinamento alático com recuperação aeróbia, é o treinamento de powerlifters (N.T: O termo powerlifter é usado no Brasil, embora alguns usem o termo “basista”. O powerlifting é um esporte de levantamento de peso com 3 componentes: Agachamento, supino e levantamento terra) e levantadores de peso olímpico russos.

Eles realizam várias séries de poucas repetições, longe da falha técnica, com adequada recuperação, sem “sensação de queima” no músculo. “Capacidade de trabalho” não é o objetivo, mas um belo efeito colateral de seu sistema de treinamento de força. Você sabia que os campeões de levantamento olímpico russos Plyukfelder e Rigert, cumpriam um turno de trabalho completo em uma mina antes de irem treinar na academia?

A lenda do levantamento de peso olímpico russo Rudolph Plyukfelder

Maximov, Selouyanov e Tabakov (2011), explicam: Alguém pode desempenhar exercícios de força longe da falha.

Ex: O atleta levanta um peso correspondente a 16 RM, 4-8 vezes.

Neste caso, a fadiga local não acontece, não existe uma alta acidez nos músculos. Surge uma situação que estimula o desenvolvimento de uma rede de trabalho mitocondrial nas fibras musculares intermediárias e glicolíticas. Portanto, um exercício próximo do máximo (70-90% intensidade), com pausas que desenvolvem o músculo aerobicamente.

Gray Cook observou que o meu “Plano de Rito de Passagem no Desenvolvimento”, descrito em meu livro “Enter the Kettlebell” (N.T: Programa desenvolvido pelo Pavel, e descrito em um de seus livros, para aumentar o desempenho no exercício desenvolvimento de ombros), é um protocolo de capacidade de trabalho. Inspirado na metodologia soviética de levantamento de peso olímpico. Embora a qualidade física força permaneça como objetivo número 1 e resistência alática + aeróbia seja apenas um efeito colateral…

Último livro do Pavel. Com vários protocolos A+A (Alático+Aeróbio)

Alguém poderia perguntar: Existe algo como “capacidade de trabalho geral” que cubra tudo o que foi discutido acima?

Sim, mas sob um nome diferente. O termo aceito pelos cientistas esportivos soviéticos décadas atrás é “resistência geral” (N.T: Tradução do termo inglês: “general endurance”).

Na ciência do esporte russa e na prática de seus treinadores, cada qualidade é subdividida em Geral e Especial.

“Geral” refere-se a: “….habilidade…. para desempenhar qualquer trabalho físico com mais ou menos sucesso.” (Ozolin, 2006).

“Especial” é o equivalente a “especificidade esportiva”.

“Resistência geral é a habilidade de desempenhar qualquer tipo de trabalho durante um período estendido de tempo, envolvendo muitos grupos musculares e colocando altas demandas nos sistemas cardiovascular, respiratório e nervoso central”. (Ozolin, 2006).

Os pontos a serem ressaltados no artigo são:

  • Quando tiver a urgência de dizer “capacidade de trabalho”, espere até que a urgência passe, ou esteja pronto a especificar o sistema energético predominante ou a potência, tempo e duração do exercício.
  • Se for incapaz de especificar ou tem algo mais amplo em mente, diga: “resistência geral”.

Na próxima parte você irá aprender que o significado russo das palavras “capacidade de trabalho”, é completamente diferente…

 

Acesse a parte 2: O que é Capacidade de Trabalho – Parte 2.


Artigo original: What is Work Capacity – Part 1.

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