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O quão Forte?

Por Marcus Lima em 18 de dezembro de 2015

Artigo escrito pelo Mike Boyle sobre parâmetros de força e relações entre os exercícios, por isso do título: “O quão forte”.

Esta é uma adaptação (como sempre), embora não tenha mexido no artigo original, modifiquei a formatação para melhor visualização e entendimento, além de sempre colocar alguma figura adicional e notas explicativas também. Os valores das cargas utilizadas estão em libras, facilita para os cálculos ficarem redondos, já que o correspondente em quilogramas fica fracionado, nas notas coloquei a correspondência de alguns valores para termos uma melhor visualização dos parâmetros.

 

O quão forte?

Mike Boyle

 

Interessante, pergunte a um preparador físico qual seria um bom número de peso no supino para um cara de 90kg e existe uma boa chance de se obter uma boa resposta. Talvez nem todos concordem, mas todos terão uma opinião.

Pergunte a um bom preparador físico o que constitui um bom nível de força na puxada vertical (N.T: O padrão de puxar na vertical são basicamente variações de barras) e em exercícios unipodais de membro inferior (N.T: Variações de agachamentos e levantamentos terra unilaterais) e você não terá uma boa concordância, se é que todos profissionais ao menos terão alguma resposta.

A resposta pode inclusive ser algo como: – “O que você quer dizer?”

Na última primavera/verão me propus a responder estas questões. O quanto de força unilateral de membros inferiores e do tronco é realmente possível? Penso que se alguém se propõe a treinar, precisa de uma meta. Se vamos treinar para força, precisamos saber o que significa ser forte.

Uma milha em 4 minutos é um grande exemplo (N.T: 1 milha corresponde a 1609,34 metros). Em 1957, Roger Bannister quebrou o recorde de 1 milha em 4 minutos. Naquele dia, ele quebrou um recorde que durava 12 anos. Ao final do ano de 1957, 16 corredores também quebraram esse recorde. É incrível o que as pessoas podem fazer quando veem que é possível. 12 anos para quebrar um recorde e em 1 ano 16 pessoas o quebram. Meu objetivo é elevar os parâmetros de força em exercícios unilaterais de membros inferiores e de tronco ao dizer aos profissionais do ramo o quanto se pode ser forte nesses exercícios.

 

Força Unilateral de Membros Inferiores

Tenho escrito extensivamente a respeito do assunto em meus livros e artigos. Quando eu escrevi o livro “Functional Training for Sports” em 2004, eu pensava que era ótimo ter atletas que podiam fazer um agachamento unilateral.Eu era um proponente inicial neste tipo de exercício e pressionava meus atletas (homens e mulheres) a serem capazes de desempenhar o agachamento unilateral.

No entanto, em 2007 meus pensamentos começaram a mudar. Notei uma certa complacência entre meus atletas. Eles eram como eu. Estavam felizes em apenas realizar o agachamento unilateral com alguma resistência externa.

Alguns na verdade estavam se tornando bastante fortes, rotineiramente usando uma sobrecarga de halteres de 20-25 libras (N.T: 9,07 – 11,3 kg). Inicialmente eu achava que isto era ótimo. No entanto, rapidamente os atletas começaram a estagnar.

Parte do problema é que com o tempo, os halteres tornaram-se muito pesados para fazer de maneira apropriada o exercício e os coletes que usávamos naquele tempo só chegavam até 20 libras. Isto significa que o máximo de peso que poderíamos adicionar, com conforto, era ao redor de 60 libras (N.T: 27,2 kg). O outro problema com que nos deparamos, é a mesma questão encontrada por muitos preparadores físicos que usam o agachamento bilateral: Na medida em que a carga aumentava, a profundidade do agachamento diminuía.

Para resolver o problema da carga, nós compramos X-Vests (N.T: Uma marca de coletes com peso, ou como chamavam antigamente: Coletes lastrados). Esses coletes podem em teoria ser carregados com até 80 libras (N.T: 36,2 kg), nós fizemos coletes de 40 e 50 libras (N.T: 18,1 e 22,6 kg respectivamente).Para resolver o problema da profundidade, começamos a usar o mesmo método que usávamos para assegurar a profundidade de nossos agachamentos bilaterais, colocamos uma caixa atrás do atleta e pedíamos para que ele a tocasse.

A única diferença era que agora estávamos fazendo isso em uma perna só. Agora podíamos ditar a profundidade e aumentar a carga. Soa como uma receita para o sucesso. Estávamos metade certos. A versão que usávamos inicialmente (como na imagem acima), estava causando um pouco de dor lombar em alguns atletas, particularmente naqueles com o fêmur longo.

Resolvemos isso usando 2 caixas, uma para ficar em pé sobre, e outra para determinar a profundidade do agachamento (N.T: Ao se usar 2 caixas, diminui a necessidade de se flexionar tanto a perna que fica no ar, tornando a tarefa mais fácil para posicionar melhor a lombar, já que não é necessário ter tanta mobilidade de flexão do quadril. Isso é especialmente útil para indivíduos mais altos).

 

Parâmetros

A próxima coisa que fizemos foi testar nossos atletas. Testar não é o mesmo que treinar. Em situações de teste os atletas irão competir. Os resultados me surpreenderam, Jay Pandolfo, dos New Jersey Devils (N.T: O Devils é um time que disputa a liga profissional de hóquei americana, a NHL – National Hockey League), conseguiu fazer 11 repetições com 95 libras (N.T: 43,09 kg).

Nosso capitão da equipe de hóquei da Universidade de Boston fez 5 repetições em cada perna com 110 libras (N.T: 49,8 kg). A média de nosso time universitário de hóquei foi 5 repetições com 80 libras (N.T: 36,2 kg). Agora eu sei que quando me perguntarem a respeito de um parâmetro de força unilateral de membros inferiores, posso dizer que:

→ 80 libras x 5 reps: Bom.
→ 110 libras x 5 reps: Excelente.

A mesma situação se aplica à força da parte superior do tronco (N.T: Especificamente ao padrão de puxada na vertical) e barra com pegada supinada. Se alguém me pergunta o que é ser “forte” para um homem, eu respondo:
→ 135 libras x 3 reps (N.T: 61,2 kg).

Se me perguntam em relação às mulheres, respondo:
→ 45 libras x 3 reps (N.T: 20,4 kg).

 

Abaixo, um parâmetro do que constitui “ser forte”, na minha experiência, em alguns exercícios básicos para homens que não usam drogas que aumentam a performance.

Supino: 

→ 1,25 a 1,5x o Peso Corporal (113 – 136 kg para um atleta de 90 kg).


Clean:

→ 1,25 a 1,5x o Peso Corporal (o mesmo do que o levantamento acima).
*(Eu gosto que meus atletas tenham um número similar entre o supino e o clean. Se você não tem essa relação, seus atletas estão passando muito tempo no supino e não tempo suficiente em movimentos de potência).

(N.T: O clean é a primeira fase do arremesso, uma variação dos levantamentos de peso olímpico. Em português vejo termos como “Receptação” ou “Encaixe” para se referirem ao clean).


Agachamento de base alternada:

→ 1x o Peso Corporal por 10 reps.
*(Nós não fazemos o agachamento bilateral com barra nas costas no meu centro de treinamento).

(N.T: Mike Boyle causou polêmica há alguns anos atrás ao declarar que tinha abolido a tradicional agachamento com barra nas costas, embora o pessoal do powerlifting se enfureça ao ler isto, ele tem bons argumentos, neste vídeo, em inglês, ele fala a respeito: Death of Squatting).


Agachamento unilateral:

→ o,5x o Peso Corporal por 5 reps.


Barra pegada supinada:

→ o,5x o Peso Corporal por 5 reps.
*(Eu também gosto que meus atletas tenham um peso total para a barra pegada supinada, peso corporal + carga externa, maior ou igual ao peso de 1 Repetição Máxima – 1RM  do supino. Em outras palavras, um atleta que tem 1RM no supino de 127 kg e pesa 81 kg deveria ser capaz de fazer uma barra com pegada supinada com uma carga externa de 46 kg).

 

Se o treinador faz testes de 1 Repetição Máxima (1RM), eu gosto que:

→ supino = clean = barra pegada supinada

(N.T: Em termos de peso equivalente entre os 3 exercícios, lembrando que na barra se contaria o peso corporal + carga externa).

 

Outra maneira de avaliamos a força é comparando exercícios similares ou relacionados. É incrível como encontramos muitos “especialistas” em determinados exercícios. Novamente, em minha opinião, ser forte não tem a ver com quantos kg se consegue fazer em um exercício em particular, mas sim com a habilidade de refletir essa força em ângulos variados. Com isto em mente, nós desenvolvemos as seguintes relações:

*Por favor, notem que isto foi desenvolvido da velha maneira de tentativa e erro. A experiência através de mais de 10 anos é que me comprova o resultado.

 

Supino = 100% (N.T: Ele usa como parâmetro o 1 RM no supino):

EX: 1 RM no supino de 300 libras (N.T: 136 kg):

→ Supino inclinado = 80% do supino (No nosso exemplo o peso seria 240 libras).
(N.T: 240 libras = 108,8 kg).

→ Desenvolvimento unilateral com halteres = 40-50% do supino (No nosso exemplo seriam 2 halteres de 60-75 libras).
(N.T: 60-75 libras = 27,2-34 kg. Ele pega como referência o valor de 40-50% do 1 RM no supino e divide esse peso em dois halteres).

*O desenvolvimento (N.T: Empurrar um peso acima da cabeça) é uma arte perdida. Incrível de se ver a disparidade em empurrar acima da cabeça (N.T: Padrão de empurrar na vertical) quando relacionada à força no supino (N.T: Padrão de empurrar na horizontal).

Penso que a maioria dos praticantes do treinamento de força seriam capazes de desempenhar melhor o padrão de empurrar na vertical, mas quase ninguém faz mais isso. Esta tem sido uma área de grande ênfase para nós no último ano.

 

No nosso centro de treinamento usamos a seguinte fórmula para qualquer variação de exercício com halteres:
(N.T: Relacionando sempre a variação com halteres com a variação com barra do mesmo exercício ou algum outro que se use de parâmetro, nesse texto o Boyle usa como parâmetro 1 Repetição Máxima – RM do supino).

Peso do halter = 80% do peso da barra/2

 

EX: 1 RM no supino de 300 libras. 80% disso seriam 240 libras (Para 6-7 RM):

Supino com halteres:
– 6 RM no supino com halteres seriam 80% de 240 libras dividido por 2.
– 80% de 240 libras = 192 libras
– 192 libras divido por 2 = 96 libras (N.T: Ele arredonda para 95 libras).

Em outras palavras, um levantador com 1 RM de 300 libras no supino deveria ser capaz de fazer um supino com halteres de 95 libras por 6 repetições.

 

Para o supino inclinado com halteres.

EX: 1 RM no supino de 300 libras.

Supino inclinado com halteres:
– Usamos 50% do 1 RM do supino e dividimos por 2.
– (300 x 0.5)/2 = 75 libras
– Outro método é usar 80% do peso do supino unilateral com halteres
– Seria então: 0.8 x 95 libras = 76 (arredondamos para 75 libras).

Então nosso hipotético atleta que levanta 300 libras no supino, deveria ser capaz de fazer um supino com halteres de 95 libras x 6 reps e um supino inclinado com halteres de 75 libras x 6 reps.

Se continuarmos a tendência e usarmos 80% dessas 75 libras, o atleta deveria ser capaz de fazer um desenvolvimento unilateral com 60 libras como indicado acima (N.T: Acima ele usa 50% do parâmetro do supino para ditar o peso de 1RM do desenvolvimento unilateral. O que fica em 75 libras).

Os movimentos acima da cabeça (N.T: Empurrar na vertical) é onde as coisas desmontam. A maioria dos atletas nesses dias precisam de bastante trabalho nesse padrão. Observe a maioria dos atletas fazendo um desenvolvimento, eles farão um esforço para tornar qualquer exercício de empurrar na vertical em um supino inclinado.

Isto permite à porção clavicular do peitoral assumir pelo deltóide no movimento de empurrar. Nós na realidade começamos a utilizar o desenvolvimento com halteres sentado, para termos um melhor controle do quadril dos iniciantes. Progredimos da posição sentada para meio ajoelhado e depois em pé, para forçar os atletas a usarem os ombros ao invés do peitoral (N.T: A progressão fica: Sentado → 1/2 ajoelhado → Em pé).

Base meio-ajoelhada

Uma dica, se você quer desenvolver força no ombro, não permita aos atletas usarem um banco com encosto. Eles podem sentar na fase 1, mas não se inclinarem para trás. Assim que inclinarem, passarão a usar mais a parte clavicular do peitoral (como no supino inclinado).

O ponto chave é se ter uma força muscular bem distribuída, e não uma performance impressionante em um levantamento. Sempre que há um atleta novo chegando com fama de ser bom no supino, eu imediatamente mudo o foco do treino para os quadris e membros inferiores.

Sempre digo aos atletas que se tiver que ser ruim em um dos levantamentos que testamos, eu espero que seja no supino. E se tiver que ser bom em apenas um, espero que seja no hang clean (N.T: O Hang clean é a primeira fase do arremesso, saindo em uma posição suspensa, ou seja, a barra não sai do chão). Eu sempre trocarei força no supino por potência no quadril.


Artigo original: How Strong is Strong? 

Instituto Fortius